eu acho que meu coração anda ficando cada vez mais azul. foi forte o trovão da noite e o apito no sonho chamava pra formar a linha de caixa. eu fui, e chorei. chorei no rufo e no rulo e chorei por ver do ladinho de mim tanta gente entregando o corpo pro tambor e cantando com a fé de quem sente o calor da explosão de uma estrela. o senhor lá na frente era só energia e vibrava uma luz intensa naquele corpo marcado pela história do tempo. meu mestre cantou um lamento com a voz mais sentida que eu já escutei e fez tremer a terra de dentro.
quarta-feira, 23 de novembro de 2016
sábado, 19 de novembro de 2016
é o ruim do mundo
fizeram o menino deitar lá na rua sabia? não tinha porquê, não sei o que passa com esses moço de farda, parece que esquecem que tem gente dentro deles. é o ruim do mundo. não sei. sei que o menino era bom, fazia mais era brincar na rua até tarde sabe? ia la em casa pedir salgado, as vezes ficava pro almoço, quando não brigava com meu mais novo. riso fácil, jeito pequeno de quem pede carinho com o olho. ali deitado na rua, pra que? que fez o menino pra isso? veio da escola agorinha. é o ruim do mundo. a boca da fome comeu a gente e cuspiu esses homem de farda. que fardo. o peso da bota no corpo dos outros, o sangue dos outros no sorriso deles. porque? essa dor que só cresce é o tempo. encolhe a gente que corre encostado no muro. pra que? é raiva mesmo aqui dentro sabe? da falta da força. força que eu vejo de sobra no trato dos homem com qualquer menino.
quinta-feira, 17 de novembro de 2016
ressaca
no fim do corredor o sapato solto no pé, o peito cheio de ar quente, tropeçou, virou a esquina da mente e caiu de novo. confusão do caralho, as vezes batia as ideia, entrava em confronto, uns três ou quatro nós pra desfazer e uma felicidade estranha que tinha nada que ver com sorriso.
não era vida de máquina, sabia. não queria o chocalho da rotina, gostava de ser estranho mesmo. mas aquilo era difícil. sabia que o mundo cobrava, sabia que o mundo cobrava caro. não tinha como pagar.
no fim do corredor o sol fez quina num vidro quebrado da passagem de ar e lançou na vista um calor esquisito, fechou os olhos e sentiu a explosão de luz aquecer a testa, festa. a ressaca era osso. o gosto do estômago voltou a garganta, apoiou o corpo no corrimão e levantou.
bateu. acho que bateu, ontem não tinha batido, bateu?
o vento da porta da rua no fim da escadaria beijou as canelas e ele saltou os dois últimos lances. pronto. agora era a rua.
gostava de andar. tempo de processo. a mente ficava fresquinha. cheiro de café na esquina, os olhos abriram. um sorriso nasceu sem querer.
não era vida de máquina, sabia. não tinha um plano, sabia.
isso era bom. isso era bom? sei não, mas era o que podia.
era o que cabia. pelo menos agora.
sorriu e entrou na padaria pra tomar café.
não era vida de máquina, sabia. não queria o chocalho da rotina, gostava de ser estranho mesmo. mas aquilo era difícil. sabia que o mundo cobrava, sabia que o mundo cobrava caro. não tinha como pagar.
no fim do corredor o sol fez quina num vidro quebrado da passagem de ar e lançou na vista um calor esquisito, fechou os olhos e sentiu a explosão de luz aquecer a testa, festa. a ressaca era osso. o gosto do estômago voltou a garganta, apoiou o corpo no corrimão e levantou.
bateu. acho que bateu, ontem não tinha batido, bateu?
o vento da porta da rua no fim da escadaria beijou as canelas e ele saltou os dois últimos lances. pronto. agora era a rua.
gostava de andar. tempo de processo. a mente ficava fresquinha. cheiro de café na esquina, os olhos abriram. um sorriso nasceu sem querer.
não era vida de máquina, sabia. não tinha um plano, sabia.
isso era bom. isso era bom? sei não, mas era o que podia.
era o que cabia. pelo menos agora.
sorriu e entrou na padaria pra tomar café.
quarta-feira, 16 de novembro de 2016
conversa inventada com dona linete
café passado cedinho e os menino no sono. desceu a rua pra ver se encontrava lúcia em casa, mas a danada já tinha ido pro serviço, foi cedo daquela vez, de certo que queria passar na lojinha antes do horário da entrada. lúcia vivia falando daquela sandália que via na vitrine, que ia ficar linda pra ela, que era da cor do vestido de festa, que não tinha outra melhor pra caber nos "pézinho chato que eu tenho" assim que ela falava, e dava risada com um sorriso marcado do tempo e gostoso demais de se ver de perto. mas toda vez que ela ia na loja a moça dizia que já tinha ido tudo, pra ela vir mês que vem e vir mais cedo, sempre mais cedo, que a sandália saia fácil. "eu sou chata né linete? a moça já nem me deixa entrar, fala lá de dentro pra eu vir no outro mês sabe? é que eu devo incomodar demais né? assim, querendo ir em loja de madame com a roupa do serviço... eu já té tenho o dinheiro sabe? pra comprar na vista. mas eu não tenho o de resto parece. eu nem devia de querer ir lá", ai a gente brigava, que eu dizia que ela ia sim e que fosse cedo no mês que vem, que chegasse antes da loja abrir pra garantir a sandália, o cheiro de café tomava conta da sala e ela me jogava um "é né?" com dois olhinhos pretos miúdos e uma risada enorme na boca.
lúcia sempre me cuidou sabe? desde de cedo, desde antes do primeiro menino. ela que me disse o que fazer pela casa, me ensinou os caminho mais curto pros maiores problemas. eu sinto nela uma mãe que também é filha. já viu coisa assim? engraçado dizer isso junto, mas é verdade, uma mãe que também é filha. é isso que eu sinto. a gente se ajuda por aqui, que as vezes a coisa engrossa. seu heitor viaja mais de mês, lúcia reclama da falta do marido, mas reclama sorrindo, que quando ele ta por ai só vejo ela de sexta que é dia de bar, sempre de cabeça baixa, sorriso murcho e olhar perdido. ela vira menos dela. como minha finada mãe me dizia, "minha filha, não deixa homem nenhum tirar você de dentro de você" e eu deixo não. passo firme com os pequenos, que é pra não ser que nem o pai, que se sumiu no mundo, sofrem pouco os dois, que eu amo tanto que nem deixo eles na solta. vivem de jogar bola e ir pra escola. não falta nada na mesa, e quando falta, lúcia me ajuda, assim faço o mesmo por ela. é assim que se caminha a gente por aqui. olha lá moço, naquela ponta da rua mora uma senhora mais velha que nós dois juntos. vive sozinha. sai quase nada, mas é feliz. sabe como eu sei? é que quando ela inventa de passeio passa aqui pertinho da casa, bem na janela que eu fico na costura. e ela canta moço, e como canta moço! uma voz velha e linda de se ouvir. eu faço é questão de parar a costura, e eu sei que ela sabe, a máquina é velha e faz um barulho danado, eu sei que ela escuta e ai ela encosta na parede da casa e acende um cigarrinho de palha, não gosto do cheiro, mas eu deixo. deixo que eu sei que depois de fumar ela canta uma canção inteirinha só pra mim. só pra mim seu moço, eu sei que é. nunca que a gente se viu de frente, mas ela sabe da parada da máquina, eu sei do cigarro, a gente se ajuda assim. a gente caminha. um dia chamo ela pra tomar um café comigo e com lúcia, quem sabe ela não canta aquela da clementina, gosto tanto. quer café moço? o senhor ta gravando? que bom que não é foto sabe, se não ia ter que ir em casa. depois se tira foto, depois que lúcia chegar, quem sabe ela não vem com a sandália dessa vez né?
lúcia sempre me cuidou sabe? desde de cedo, desde antes do primeiro menino. ela que me disse o que fazer pela casa, me ensinou os caminho mais curto pros maiores problemas. eu sinto nela uma mãe que também é filha. já viu coisa assim? engraçado dizer isso junto, mas é verdade, uma mãe que também é filha. é isso que eu sinto. a gente se ajuda por aqui, que as vezes a coisa engrossa. seu heitor viaja mais de mês, lúcia reclama da falta do marido, mas reclama sorrindo, que quando ele ta por ai só vejo ela de sexta que é dia de bar, sempre de cabeça baixa, sorriso murcho e olhar perdido. ela vira menos dela. como minha finada mãe me dizia, "minha filha, não deixa homem nenhum tirar você de dentro de você" e eu deixo não. passo firme com os pequenos, que é pra não ser que nem o pai, que se sumiu no mundo, sofrem pouco os dois, que eu amo tanto que nem deixo eles na solta. vivem de jogar bola e ir pra escola. não falta nada na mesa, e quando falta, lúcia me ajuda, assim faço o mesmo por ela. é assim que se caminha a gente por aqui. olha lá moço, naquela ponta da rua mora uma senhora mais velha que nós dois juntos. vive sozinha. sai quase nada, mas é feliz. sabe como eu sei? é que quando ela inventa de passeio passa aqui pertinho da casa, bem na janela que eu fico na costura. e ela canta moço, e como canta moço! uma voz velha e linda de se ouvir. eu faço é questão de parar a costura, e eu sei que ela sabe, a máquina é velha e faz um barulho danado, eu sei que ela escuta e ai ela encosta na parede da casa e acende um cigarrinho de palha, não gosto do cheiro, mas eu deixo. deixo que eu sei que depois de fumar ela canta uma canção inteirinha só pra mim. só pra mim seu moço, eu sei que é. nunca que a gente se viu de frente, mas ela sabe da parada da máquina, eu sei do cigarro, a gente se ajuda assim. a gente caminha. um dia chamo ela pra tomar um café comigo e com lúcia, quem sabe ela não canta aquela da clementina, gosto tanto. quer café moço? o senhor ta gravando? que bom que não é foto sabe, se não ia ter que ir em casa. depois se tira foto, depois que lúcia chegar, quem sabe ela não vem com a sandália dessa vez né?
terça-feira, 8 de novembro de 2016
a palavra é
a palavra assusta, e se vem sem vento ela murcha.
acaba na testa, tentando sair mas doendo a cabeça.
a palavra é foda, ela nunca vem sozinha, nunquinha.
é cultura, é osso e carne, é antes.
a palavra é peito, é leite, olhar de mãe.
a palavra é mãe.
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