segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

cresce menino!

O Silencio é o corte mais profundo. Amargo da vida que saliva vira. Severo senhor que apruma a construção da falta. O Silencio é da cor que a dor deixar. Quieto pacto travado por escolha. Paisagem sem gosto pra quem busca vida. O Silencio é o caminho de quem perdeu o que nunca teve. Escolha madura. Insegura. Manchada de vozes que antecederam a solidão da história.

domingo, 26 de dezembro de 2010

sobre a vida quando vista

O Sol caiu sobre mim numa tarde de quarta, aos poucos o movimento da cidade consumiu minha imagem do dia, me perdi olhando em frente, sentado na traseira de um linha direta, ouvido o povo e a música. O trânsito me parou, me fez tirar a vista do dia bonito e olhar pro lado. Duas senhoras, cabelos brancos e um ramo de folha nas mãos. Eu abro um sorriso, simples, desses de tarde clara, sei que nada mudou, ainda correria, ainda vida inquieta de tempo, mas gravar esse caminho me fez feliz. O ônibus segue, eu não. Fico parado, guardado entre aquelas duas senhoras, absorvido pelo tempo que deixou grisalhas as minhas agonias semanais. Um vento embala a cadeira de balanço da vida. Tudo pára. Chegamos ao terminal.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

culpa

O encontro entre dois barcos forma um buraco no mar, forma centelha de caos.

O encontro entre dois barcos faz quem navega ser sódio, ser sal de espanto e de medo. Faz a solidão ser compartilhada e o desejo de vida virar lágrima.

O encontro entre dois barcos faz o mar devagar, divagar sobre o que resta, sobre a parte que sobra no infinito azul que ele carrega.
O peso do mar é a falta de escolha.
Difícil de mais ser tão profundo.

Barulho de onda que encontra a madeira, silencio dos corpos dançando a melodia torta que rege o caminho do escuro.

O encontro entre dois barcos forma um buraco no mar.
E sozinho, ele chora.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

sobre o amor que ainda é paixão

Entre os cabelos molhados, minhas mãos calam tua festa. Entre o teu olhar e o meu, a pressa. Saia nua pela casa. Saia, blusa e sutiã, o que resta? Nós dois numa emboscada, num deserto sem palavras. Nós dois no fim do voo perdendo o que sobrou das asas.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

sobre o amor quando fresquinho

Enquanto o vento sopra palavras de conforto para os meus ouvidos, que pela distância da tua voz ficaram tristes, o tempo passa vagaroso, como criança que acorda com preguiça de escola e se demora para sair da cama. Mais vagaroso que o tempo estou eu. Quase vaga-lume. Piscando os olhos na noite que corre devagar, pensando nas saudades do teu corpo, nos recantos dos teus cantos, teus cheiros, teus gostos.
E isso que não passa nem vinte e quatro horas da ausência.

Acho que o coma profundo me espera.
E eu... (des)espero-te

terça-feira, 30 de novembro de 2010

sobre a primeira maria

Maria Pequena vivia de andar na lua. Não havia um só morador do sopé que não conhecia seu jeito aviãozinho de ser. Quando dava na telha voava. Podia até parecer presente, escutando a avó falar do bordado, mas não. Maria Pequena voava... Não controlava sua falta de estar ali, quando dava por si já não era mais possível voltar atrás. As vezes se doía por deixar a avó falando para as linhas, mas viajar sozinha era tão bom que a dor desatinava assim que o General do primeiro batalhão do exército da Córsia vinha lhe pedir ajuda na Segunda Guerra dos Albinos Pregoeiros. Ela aconselhava, mas não se envolvia na disputa. Ser Embaixadora da Terra dos Devaneios não era fácil, mas lhe apetecia o cargo. Ela mesma o havia criado na ocasião da primeira batalha. Maria Pequena voava...

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

orgasmo

Apertei seus cabelos com a força que meu corpo tinha, deixei-me levar. Seresta em mim. Ela sabia como me dominar. Sabia do íntimo que em mim calava. Só ela o acordava. Eu desentendia de tudo. Minhas certezas escapavam. Deslizavam na leveza em fúria que seu corpo produzia sobre o meu. Difícil, eu não me persuadia. Ela edifício andares me fazia subir, pouco a pouco domava minhas fantasias. Até conseguir o que queria, até me ter em suas mãos. Lembro de sua voz suave aos meus ouvidos: "Pula. Se me queres, pula!". Lembro de suas unhas traçando estrada em minha pele, dizendo fúria. Lembro da queda, amaciada por seu corpo nu e da espera do dia, que nos fazia deixar de ser um só, que nos fazia duvidar do que a noite havia escrito na pele. Sonhávamos o resto da manha, aguardando a chegada da próxima lua.

domingo, 21 de novembro de 2010

indicação para cena final

Não mire a tela, olhe nos olhos dela, fixos na película com aquele brilho de anseio, querendo ser personagem, querendo vento e corcel, para aquietar peito cheio. Não mire a tela, diga no ouvido dela: "Tua pele colorida, com a luz do filme brilha. Doce encontro nessa sala, minha vida agora cala, para ouvir tua melodia." Não mire ela, nem tela. Feche os olhos. Deixe o cinema falar. Respire a trilha do escuro. Perfume e desejo de beijo. Fim do filme, resta o amor, terno e puro.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

espero

Espero um caminho claro, um vagalume no escuro, uma voz não um zunido, um afago e não um rugido. Espero, como tu espera. Ai sentada sem meias, olhando da tua varanda a rua da tua cidade, o sangue vermelho nas veias, o peito cheio de areia que escorrega entre meus dedos. Espero o desapego, o fim do fogo e do medo, o passado numa fogueira queimando o que já cansei, silenciando o barulho das coisas que eu esperei. Espero como se espera, mãos nos bolsos, sem palavras, o povo do lado me aperta, a vida corre vazia, eu atrás vou dando seta, esperando algum alerta ou um soco que me pare, que me faça desespero, que me tire dessa espera, que me mexa, que me mude!



Espero



não esperar mais

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Amanha eu falo

Sentei na varanda. Mãos na toalha de renda e um livro para bordar minhas frases quietas. Sabia que por ali ele passaria, sabia que ele viria, com a mochila em um dos ombros, assobiando alguma canção bonita. Eu trancada nos próprios sapatos nada falaria, talvez um sorriso para o livro ao meu lado maquiando a vontade de sorrir em frente, de sorrir nele, de abrir os braços e a blusa para ele e dizer "Vem, que eu te entrego minha boca nua, que eu aprendo  a ser só tua. Vem me ensina o bom do amor que até hoje eu só fui brasa. Vem queimar meu peito e a casa". Mas nada disse, ele passou, parou de assobiar e dobrou a esquina. Amanha eu falo.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

foto antiga

Guardados os retratos, ele pegou minha mão e colocou confortavelmente contra o próprio peito. Disse-me que fosse sua, que ele levaria meus pés ao fim da história antes de termos lido o começo, que nada mais seria igual. Disse-me que fosse sua, que o som da minha voz era vermelho, que a cor do meu pulsar era música para o ouvido dele. Disse-me que fosse sua, que na minha nudez eu era a rainha da calma, a senhora do tempo que ele sempre procurou para poder tornar-se imortal. Disse-me que fosse sua. E eu fui. Fui de novo e sempre. Renovei minha armadura de mulher com o prazer que buscava para ele. Prazer que eu não entendia direito, mas que pelas palavras doces que ficaram em minha pele naquele dia frio, enquanto contávamos pessoas nas fotos antigas, eu acreditava existir. Fielmente acreditava. Como se acredita na santa quando promessa. Eu acreditava. Fielmente acreditava. Como folha que ganha o vento com a incerteza de onde vai e com a fé de poder ir. Eu acreditava. Fielmente acreditava. Mas ele não... Partiu. Deixou-me nua, de corpo e de coragem. Deixou-me cheia da culpa que não era minha. Disse-me que mudou de planos. Que a vida segue. Me mandou um cartão da capital. Arrancou a fé do meu corpo como fazia com meus vestidos. Já não mais rainha do tempo, passei a contar pessoas, encostada na janela onde víamos aqueles velhos álbuns. Virei foto. Imortal na minha certeza de nunca mais ser dele. Perdi a cor. Guardei-me, desbotada com os pés no fim da história e entre os retratos.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

chato

Eu quero valorizar toda esta insensatez e discutir estas razões, e conhecer os teus porquês. Eu quero me antecipar a qualquer forma de rigidez, aprimorar o mau humor e corrigir a lentidão da correção destes problemas.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

ao poeta descalço:

Era tarde já. O outrora brigava com o céu pra parecer aurora, de nada adiantava, cores diferentes, mais cinzas que laranjas. Era tarde já. Um calçado de cadarços estragados cruzou o cimento duro em direção a ponta de mato que abrilhantava o jardim de pedrinhas. Ali descalçou-se, virou pé, pisou grama, disfarçou-se de minhoca e sorriu com o mindinho, depois com o dedão, depois outros dedos. Era tarde já, mas algo havia acontecido, noite clara e borboletas anunciando asas a quem dormia: um poeta descalço havia sido plantado.


onde o poeta descalço mora

o som que o poeta descalço faz

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

jogo de domingo.

Emblema do time no peito, tênis de futebol, uma camisa que passa dos joelhos, mas que mostra o número e o nome do artilheiro. É assim que o moleque vai. Ver o jogo com o pai. A euforia, a angustia, a ira, a paixão, sentimentos grandes demais pra caberem dentro de alguém de cinco anos, mas isso não vale pra ele. Quase um adulto quando o tema é o time, escalação na ponta da língua, sabe mais que o técnico, que segundo ele sempre erra a escalação e a substituição do segundo tempo (se o pai deixasse ele xingava), entoa todos os hinos com a força que seu tamanho aguenta. A única coisa que ele não entende ainda é a derrota. O controle emocional que demonstrava ao falar das táticas e jogadas ensaiadas que havia escutado na conversa do pai com o padrinho se vai. Assumida a condição de criança ele chora, pede colo e bate pé. A tristeza é tão grande que vira cansaço, o sono chega antes do fim do jogo. E o ombro paterno vira porto seguro. Volta dormindo pra casa. Mal sabe ele que com passos vagarosos, dando tempo a chuva que acompanha a volta e lava o medo de mostrar fraqueza, enquanto acalenta o filho e diminui o peso da partida perdida, enxugando as lágrimas no cabelo do pequeno, o menino mais velho também chora.

sábado, 30 de outubro de 2010

preguiça

De barriguinha pra cima
Dorme o menino vadio
Catando estrelas e contando grilos

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

início de primavera

Era Setembro. Eu sei, eu lembro.

Tinha na noite um certo ar de estranha conveniêcia, como se o dia caminhasse para um momento já combinado. Como aquelas batidas de cotovelo que sempre antecipamos, mas nunca há tempo o suficiente para desviar. Talvez fosse mesmo o tal destino. Menino febril que adivinha tudo. Não sei, acho que não. Mas minha calma tinha sido atormentada, uma certa insegurança incabida tomou conta de mim por um tempo maior do que eu esperava. Eu sabia o que fazer e não fazia, o que dizer e não dizia. Meu olhar era a única coisa que falava. E tentava compensar minha quietude esquisita brilhando cada vez mais. Que bom. Ele me salvou, falou tudo o que eu não tinha dito. Dançou por mim a última canção da noite. Mas não sozinho. Outros olhos nos meus.

Era Setembro. Eu sei, eu lembro.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

vida aos pouquinhos II

Há de ser o tempo um guia, pra essa euforia estranha, entre premissas e demandas, fico eu com minha vida, acalmo minhas agonias da forma mais intranquila.
Dou tempo ao tempo.
Luto; batalha e enterro.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

sobre a chuva que não cai

A casa bonita perdeu seu dono 
Perdeu a fome de alguém por morar

Varanda quieta janela fechada
Janeiro sem festa sem vida por lá

Parece que ali o tempo tem sono
Balançando a rede da vida que vai

Parece que ali sorrisos armados
Amor estragado que ficou pra trás

Empresta mãe um cantinho
Pra que nessa casa a gente possa entrar

Empresta mãe tua mão doce
Pra desalegria daqui se mudar...

domingo, 24 de outubro de 2010

a bonita história do cão andaluz e da mulher tempestade

O forte ficava longe da casa, os dois tinham de caminhar um tanto quanto o gato tem de esforçar-se pra pular o muro. Mas iam...
Braços dados e dedos cruzados pra nuvem nenhuma atrapalhar.

Ela era aquela, daquelas, pedaço de mundo em corpo miúdo, perdição pra olhar perdido, remela nos cantos dos olhos, doce no canto da boca e um jeito de mulher que encanta o vagabundo nas paradas de zarcão e seduz sem querer os desavisados que andam sem guarda-chuva nas vielas da cidade. Ele era o cão, o desgranhado, barba mal feita e cabelo descortado, vivia com as calças de ontem e o dinheiro amassado, mas sempre com os olhos de quem já viu muito e
ainda quer mais.

O forte ficava lá longe, mas os dois a pé descorriam, depois corriam e assim iam, sem dizer uma palavra além das que os olhares trocavam. E na chegada
da noite, com a lua alta, enquanto as estações quentes dormiam e o pé gelado era a sensação, lá estavam eles. No forte. Lá longe. Cruzando os dedos por estrelas cadentes e sonhando alto de bolsos vazios.

Tudo isso eu vi num retratinho pequeno da parede de um quarto que passei. Perdi o retrato, não voltei ao quarto, mas a história eu guardei.

vida aos pouquinhos I

A porta aberta pra rua deixa o vento entrar,
sopra meu sono no sofá velho da sala de TV.

Lá fora o tempo passa.


Cá dentro passo eu, dormindo poesia.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

que é pro amor poder vencer...

Diz a noite que foi ela
Que diante do desejo
Quis com a lua namorar
Diz que o mundo disse não
Que a lua sendo uma moça, é obrigada a ser do mar
Mas olha que mundo besta
Noite e lua tão perfeitas pra junta as duas "fica"!?
Diz que a lua quis fugir negou no mar se deitar
Quis ser luz em outra terra,
Quis pintar uma outra tela, pra com a noite ela ficar


Mas o mundo revoltou-se, fez a noite terminar, fez o dia ganhar tudo, brilhando com o sol o mundo que cansado foi girar, e girando percebeu,

Que sem noite lua não vem, que dia sem sol não tem, que não importa se é moço ou se diz que é moço, se é moça ou moça quer ser, importa sim é o afeto esse poder inquieto que cola eu em você, poder que a gente não vê, mas sente se é pra valer, como a lua sente a noite e alumia sem saber que o sol tá esperando o dia, pra brilhar com toda força que é pro amor poder vencer.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Hoje um xará me aconselhou a publicar um escrito lido numa cantina... Eu disse que não... mas bem, tenho em mãos este espaço criado por mim, e posso muito bem fazer dele um espaço pra dizer coisas desimportantes. Então tiro o pé da forca e passo a escrever novamente nesse local, agora pretendendo mais frequencia e menos euforia.

Abaixo o texto que meu xará leu e indicou publicar:

Quando meu filho um filho ter
Com a lida do tempo vou pelear
Nos olhos dele quero ver
O lago dos meus brilhar

E se de mim o menino rir
Do meu jeito de mal falar
Dos buracos do meu sentir
Dos passos que eu não sei dar

Com ele quero sentar
Mostrar por onde pisei
Falar do amor que eu não sei
Mas que mesmo assim posso dar

Cantar cantiga esquecida
Que fala um pouco da lida
Da minha vida sofrida
Pra ele estudo ganhar

Aí eu pego sua mão
E digo bem devagar
"filho tens tempo,
Que o meu o mundo levou
Faz da vida tua folia, canta e espaia a alegria que em teu pai sempre morou. Eu sei que não sei chorar, mas prende no meu olhar os teus por um tempo e vê. Teu pai nunca viu o mar, Não sabe pra onde o trem vai, de avião nunca voou. Mas da varanda de casa viu a noite todo dia, com as mesma estrela que tu via da cidade que tu mudou. E com essas mão hoje doída, foi na lavoura da vida que teu sonho junto sonhou. Te amo eu não sei dizer, um abraço eu posso tentar, mas lembra que o velho aqui por ti sempre vai rezar. Fica em paz meu menino, faz teu caminho no mundo. Me leva nas tua cantiga no teu olhar mais profundo".

sábado, 30 de janeiro de 2010

a menina fluorecente

A menina entrou, apagou a luz do quarto, deitou sobre a cama bagunçada e dormiu.
sonhou com laços de fitas, coelhos, nostalgias, príncipes pequeninos, músicas orquestradas e sorrisos compartilhados. Não sabia, mas o tempo todo ela brilhava, inundava de luz o quarto que lutava para permanecer escuro. Era uma luz forte que saia dela, bonita de se ver, tocava na gente e entrava no corpo sem pedir licença... luz de fazer os olhos marejarem.

O dia bateu na janela, a luz da menina que tomava conta de tudo o deixou entrar, e sem rodeios saiu! Fugiu pra fora por fresta aberta e unindo-se a claridade cantada pelos passarinhos ganhou a rua, fazendo do inicio da manhã um sonho.

Um sonho de menina fluorecente.